As autoridades de saúde na província de Nampula, norte de Moçambique, realizam a segunda campanha de rastreio e tratamento de pelo menos 200 pessoas com albinismo, após 16 diagnosticados com cancro de pele em junho, foi hoje anunciado.
“A iniciativa visa reforçar o acompanhamento médico especializado deste grupo populacional particularmente vulnerável aos efeitos da exposição solar. Os pacientes serão submetidos a exames para deteção precoce de lesões cancerígenas e pré-malignas, como a queratose actínica, uma condição comum em pessoas com albinismo devido à falta de pigmentação da pele”, disse Marcelo Banquimane, médico dermatologista no Hospital Central de Nampula (HCN).
A segunda campanha, a ser realizada pelo HCN, vai decorrer entre os dias 13 e 17, com apoio da organização não-governamental espanhola África Direto, e contará também com uma equipa reforçada composta por cinco dermatologistas e dois médicos da especialidade de cirurgia maxilofacial.
Aos pacientes deverão ser aplicados diferentes tipos de tratamento, incluindo cirurgias e crioterapia, além da distribuição gratuita de cremes protetores solares, fundamentais na prevenção de novos casos de cancro de pele.
“Na primeira campanha ocorrida em junho, o hospital rastreou aproximadamente 160 pacientes, dos quais 16 foram diagnosticados com cancro de pele. No total, cerca de 50 tumores foram removidos”, recordou Marcelo Banquimane.
Apesar dos resultados da fase anterior, o médico dermatologista refere que o Hospital Central de Nampula enfrenta desafios relacionados com o acompanhamento pós-operatório dos pacientes, sobretudo dos que vivem em distritos e localidades distantes da cidade de Nampula.
“A limitação de recursos financeiros tem dificultado o transporte dos doentes de volta ao hospital para as consultas de controlo, o que aumenta o risco de complicações ou de recidiva do cancro”, frisou o dermatologista.
Na ocasião, o médico apelou para a colaboração de empresários locais e parceiros sociais para apoiar na logística das futuras campanhas, principalmente no transporte de pacientes e de equipas médicas, pois entende que o reforço do apoio poderá garantir um acompanhamento “eficaz e contínuo dos doentes após as cirurgias”.
“A falta de controlo pós-operatório pode comprometer os resultados alcançados, uma vez que algumas feridas podem infeccionar ou o cancro pode não ser totalmente removido”, alertou.
A campanha prevê abranger pessoas provenientes de 15 distritos da província, tendo sido já mapeados 148 pacientes oriundos de Nampula, Nacala Porto, Nacala à Velha, Nacarôa, Moma, Monapo, Malema e Lalaua.
O Governo moçambicano admitiu, em 09 de junho, que as pessoas com albinismo continuam a enfrentar “estigmas profundos” no país, incluindo mutilação, discriminação e exclusão social, prometendo ajustar a legislação para proteger este grupo.
“Esta realidade é inaceitável e deve ser repudiada com firmeza por todos nós. É uma ferida aberta na nossa consciência coletiva e violação dos princípios consagrados na nossa Constituição da República e nos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo nosso país”, disse, na altura, Mateus Saize, ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, durante o lançamento da campanha sobre a consciencialização do albinismo, em Maputo.
As pessoas com albinismo têm sido vítimas de perseguições, violência e discriminação devido a mitos e superstições, que incluem o uso de órgãos ou ossadas em rituais, sendo colocadas entre os principais alvos de violações de direitos humanos.
A profanação de sepulturas é também uma realidade, para se saquearem as ossadas de albinos enterrados.
Os curandeiros africanos podem chegar a gastar mais de 70 mil euros por cada órgão de uma pessoa albina.
Dados divulgados em 2023 pela Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) indicam que, desde 2014, só em Moçambique, pelo menos 114 pessoas com albinismo desapareceram em circunstâncias não esclarecidas.