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Mais sem-abrigo nas urgências e falta de respostas sociais preocupam hospitais

LUSA
13-05-2025 07:20h

Hospitais da Grande Lisboa estão preocupados com o aumento do número de pessoas sem-abrigo que recorrem às urgências para pernoitar, alertando para a escassez de respostas sociais fora do contexto hospitalar.

Vários hospitais contactados pela agência Lusa referem que a afluência desta população aos serviços de urgência tem vindo a aumentar, não por motivos de doença, mas por necessidades básicas como alimentação, higiene ou simplesmente um teto para passar a noite.

A Unidade Local de Saúde Amadora-Sintra registou um aumento do número destas situações, com dois ou três casos por semana em média. Este ano, até 29 de abril, totalizou 40.

Há casos em que os utentes em situação de sem-abrigo apresentam uma dependência física transitória, mas acabam por ficar internados apenas por motivo social até recuperarem a autonomia física, uma condição exigida pelos centros de acolhimento.

“É um problema reconhecido por todos os serviços da comunidade porque é uma preocupação não só da saúde, mas de todas as estruturas com quem trabalhamos, nomeadamente das autarquias da Amadora e de Sintra” e das instituições que apoiam esta população, afirmou a diretora do Serviço Social da Unidade Local de Saúde (ULS) Amadora-Sintra.

Adélia Gomes salientou que as entidades tentam “fazer o melhor”, mas com a “consciência de que ainda há muita necessidade de resposta e de melhor funcionamento entre todos para que os problemas se minimizem ou solucionem”.

Mas reconheceu que “dificilmente isso irá acontecer” devido à diversidade e complexidade das situações.

“Há algumas associações que também trabalham com estas situações e, em conjunto, vamos tentando fazer o possível, mas, na verdade, é uma necessidade crescente que temos vindo a constatar”, salientou.

Segundo a diretora do Serviço Social, a dificuldade no acesso à habitação agravou o problema: “O arrendamento de um quarto é cada vez mais difícil”, tendo em conta os rendimentos parcos destas pessoas.

Para Adélia Gomes, todas as instâncias das diferentes áreas, nomeadamente social, da saúde, da justiça, têm de “estar despertas e disponíveis para encontrar mecanismos de ajuda e de apoio” para estas situações.

Defendeu um “maior investimento” nesta área e um reforço de recursos humanos nos centros de acolhimento, para poder apoiar quem aceita a ajuda e sensibilizar os outros que a rejeitam para poder sair daquela situação.

Também o Hospital São José sente o impacto do fenómeno, sobretudo, no momento da pós-alta clínica, que representa “um dos maiores desafios na prestação de cuidados a esta população”.

“A dificuldade em implementar um plano de cuidados proposto ao utente e a inexistência de respostas sociais suficientes por parte da comunidade são as razões principais que, por vezes, originam protelamentos de alta hospitalar, permanecendo os utentes a aguardar uma resolução social adequada à sua situação”, salienta a ULS São José.

O Hospital São José conta como o apoio do posto da PSP, no serviço de urgência geral, que colabora com o Serviço Social na identificação destes casos.

Estes casos são encaminhados para as respostas da comunidade, mas nem sempre é possível concretizar o plano de intervenção por diversas razões, como inexistência de resposta social (alojamento, medicação, alimentação, higiene pessoal), a recusa do utente e até mesmo o abandono do serviço de urgência, antes da avaliação pelo Serviço Social, refere a ULS numa resposta à Lusa.

“Todas estas articulações são difíceis, morosas e de difícil resolução”, salienta a instituição, que nos primeiros quatro meses deste ano já sinalizou 184 situações.

No Hospital Santa Maria, um dos maiores do país, o cenário é semelhante. Este ano, até 30 de abril, registou 79 admissões de pessoas sem-abrigo no Serviço de Urgência Central, mais 32% do que no mesmo período de 2024 (60).

A ULS Santa Maria refere que estes utentes apontam “a ausência de respostas na comunidade” como principal motivo para recorrer ao hospital. No entanto, também verifica, segundo os profissionais, a sua falta de adesão a planos de intervenção social.

O Serviço Social da ULS contacta sempre as instituições da comunidade, como a Unidade de Atendimento à Pessoa Sem-Abrigo, a Linha Nacional de Emergência Social, o Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo, Comunidade Vida e Paz, mas as respostas, na grande maioria dos casos, são ainda insuficientes para o volume de referenciações efetuadas.

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