O bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, considerou hoje “absolutamente lamentável” a transferência forçada de médicos do Hospital do Barreiro para o Hospital Garcia de Orta, em Almada, para garantir o funcionamento das urgências obstétricas.
O Expresso noticia hoje, citando fonte do gabinete da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, que a equipa de obstetrícia do Hospital do Barreiro vai ser mobilizada, por despacho, e que a transferência forçada deverá ocorrer logo que o Governo avance com a concentração das urgências de obstetrícia da margem sul em Almada, tal como anunciou esta semana no parlamento.
Em declarações à agência Lusa, Carlos Cortes considerou a decisão “absolutamente lamentável”, sublinhando que “a Ordem dos Médicos censura qualquer tipo de intervenção colocada, logo à partida, desta forma”.
“Em primeiro lugar, temos de garantir sempre a segurança clínica”, que não deve ser imposta “por decreto”, mas com a tomada das opções técnicas mais adequadas.
O bastonário defendeu que é necessária uma reorganização das urgências de ginecologia obstetrícia na península de Setúbal, que é “um ponto vermelho, muito delicado, muito sensível, com imensas dificuldades”, com a criação de “todas as condições” para conseguir ter equipas completas.
“A história da Península de Setúbal na área da obstetrícia, nestes últimos meses e nestes últimos anos, tem sido uma história de sucessivos falhanços, de propostas, de anúncios que depois acabam por não dar em absolutamente nada”, lamentou.
Mas, avisou, “esta postura de querer fazer as coisas à força, obrigando, sem dialogar, sem falar, sem explicar os objetivos, sem explicar como é que as coisas vão ser feitas, sem ouvir também outras opções, outras possíveis soluções, pode levar a mais um falhanço”.
O bastonário lembrou que já houve tentativas em todo o país de obrigar médicos a deslocarem-se para outros locais, “contra aquilo que é a razoabilidade técnica, a evidência técnica”, o que acabou com a saída dos médicos como aconteceu no Hospital Santa Maria, em Lisboa, de onde saíram sete obstetras.
“Temos esta experiência em Portugal, por isso é que eu acho este anúncio lamentável. É de alguém que não conhece a realidade de Portugal”, vincou.
O bastonário disse esperar que não se repita a saída de médicos do SNS por se “impor um enquadramento que não fazia sentido” e apelou a uma solução baseada na legalidade e no respeito pelas pessoas.
“Tudo aquilo que é feito à força, posso-lhe garantir, não vai correr bem e nunca terá o apoio da Ordem dos Médicos”, declarou.
A ministra disse no parlamento que, para a concentração da urgência no Hospital de Almada, com o apoio do Hospital de Setúbal (a receber casos enviados pelo INEM e pelo SNS 24), seriam necessárias sete equipas completas para o de Almada e três de prestação de serviço.
Contudo, os sindicatos, ouvidos pelo Expresso, defendem que tal só será possível em regime de voluntariado ou relativamente aos médicos em dedicação plena, que são obrigados a garantir urgências que distem até 30 quilómetros do hospital a que pertencem.
Segundo Expresso, o despacho só depende da assinatura da ministra e não exige negociação.
Num esclarecimento enviado hoje às redações, a propósito da urgência regional da Península de Setúbal, e na sequência da notícia do Expresso, o Ministério da Saúde afirma que o despacho ainda está a ser a trabalhado.
“As equipas dos ministérios da Saúde e das Finanças estão a ultimar o enquadramento jurídico da futura urgência regional da Península de Setúbal, que dará resposta às necessidades das mulheres grávidas e recém-nascidos da região”, refere.
O Ministério da Saúde acrescenta que “o diploma pretende, também, assegurar a justa e devida compensação dos profissionais que trabalham no Serviço Nacional de Saúde”.