O Observatório Cidadão para a Saúde, ONG moçambicana, alerta para "insuficiência de recursos humanos" nas unidades sanitárias face à redução de novas admissões previstas na proposta do Orçamento do Estado 2026, criticando ausência de estratégia "consistente" de recrutamento.
"O cenário projetado pelo PESOE [Plano Económico e Social e Orçamento do Estado] 2026 não apenas perpétua a insuficiência de recursos humanos no setor da saúde, como compromete diretamente a capacidade do Estado de garantir a cobertura universal e de melhorar os indicadores de saúde pública", lê-se na análise da Organização Não-Governamental (ONG) Observatório Cidadão para a Saúde referente à proposta do PESOE para saúde.
Na proposta do PESOE 2026, o Governo prevê contratar para a saúde 582 trabalhadores em 2026, menos 80% face ao ano anterior, conforme a análise do Observatório, comprometendo a expansão dos serviços da saúde.
"A redução contínua nas admissões aprofunda este défice e coloca em causa a sustentabilidade das metas definidas no PESOE 2026, nomeadamente o aumento da cobertura vacinal, o rastreio do cancro do colo do útero e a ampliação do acesso a cuidados de saúde reprodutiva", refere o Observatório.
Segundo esta análise, a "carência" de profissionais não apenas vai comprometer a execução dos programas prioritários, mas também vai gerar sobrecarga de trabalho, queda na qualidade da assistência, desmotivação e agravamento das assimetrias entre zonas urbanas e rurais.
"A ausência de uma estratégia consistente de recrutamento, retenção e valorização profissional ameaça transformar o défice de recursos humanos num dos principais gargalos estruturais do sistema de saúde moçambicano", lê-se no documento.
O observatório critica também insuficiências e pouca sustentabilidade das medidas de atração e retenção dos profissionais de saúde no setor público, apontando para a falta de incentivos, condições adequadas de trabalho e de progressão na carreira.
O documento aponta que 97,9% dos investimentos em saúde continuam dependentes de doadores, limitando a autonomia orçamental e expondo o sistema à volatilidade do apoio externo.
"A análise da despesa pública per capita em saúde revela uma tendência de subfinanciamento persistente e agravamento da lacuna entre as necessidades reais da população e os recursos efetivamente disponibilizados", segundo o documento.
A trajetória "descendente" ocorre num contexto de aumento da procura por serviços de saúde, impulsionado por uma taxa de crescimento populacional anual, com o observatório a pedir aposta no financiamento à saúde.
"A redução real da despesa per capita, mesmo em termos nominais, sugere que o orçamento da saúde não está a acompanhar o crescimento demográfico, o que, na prática, diminui a capacidade do Estado de prestar serviços básicos com qualidade e equidade", aponta o Observatório.
"Esta tendência contradiz o compromisso do Governo em fortalecer o capital humano e melhorar os indicadores de desenvolvimento social, pilares centrais do Plano Quinquenal do Governo 2025–2029. A persistência deste nível de despesa revela que o direito à saúde continua a ser condicionado pela restrição fiscal e pela dependência de financiamento externo, colocando em causa a sustentabilidade do sistema e a sua capacidade de resposta a choques sanitários e sociais", acrescenta.
Como soluções, a curto prazo o Observatório pede reforço na "coerência orçamental" e abastecimento trimestral de medicamentos necessários, incluindo relatórios públicos por província e a criação de um plano de emergência de recrutamento para 3.000 vagas.
A médio prazo, a ONG pede a institucionalização de uma Estratégia de Financiamento da Saúde através de um Fundo Nacional de Saúde com receitas fiscais específicas, o reequilíbrio de investimentos garantindo 40% dos recursos de capital para cuidados primários e prevenção e implementação contratos de desempenho vinculados a indicadores de cobertura e qualidade.