O cancro do fígado mata 1.200 pessoas/ano, segundo um estudo de investigadores portugueses, que pedem uma aposta forte na prevenção e estimam um impacto económico anual da doença de 77 milhões de euros em 2027.
Em declarações à Lusa, José Presa Ramos, coautor do estudo, sublinha a importância da aposta na prevenção e lembra: “as estimativas são feitas com base nos custos daquele momento, provavelmente, se o fizéssemos agora, os custos seriam muitíssimo superiores”.
O especialista, que presidiu à Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado, que realizou o estudo em parceria com a Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia e a Exigo consultores, alerta ainda para o facto de mais de metade dos casos serem diagnosticados numa demasiado avançada da doença, sublinhando a necessidade de uma resposta mais rápida no rastreio.
“Quando chegam à consulta os doentes chegam já em fases muito avançadas da doença, e isso tem custos”, contou o especialista, referindo que, neste momento, o tratamento indicado para estes doentes são esquemas baseados em imunoterapia.
Acrescentou ainda os outros custos da doença: “estes doentes vão deixar de trabalhar (…), vão representar uma sobrecarga para a segurança social, e isto tudo são anos de vida perdidos, além do sofrimento para o doente e para a família”.
O estudo, que contou com o apoio da Roche e estimou a carga da doença até 2027 e o custo deste tipo de cancro de Portugal, indica que a prevalência do carcinoma hepatocelular - o tipo mais comum de cancro do fígado - está aumentar, passando de 4.151 pessoas em 2023 para 4.851 em 2027, exigindo “intervenções de saúde abrangentes e eficazes”.
Os custos atribuídos a este cancro também devem aumentar, passando de cerca de 70 milhões de euros (2023) para mais de 77 milhões (2027), o que totaliza cerca de 370 milhões de euros nos cinco anos avaliados. Deste valor, 44,3% está relacionado com o tratamento sistémico e 29% com o transplante hepático.
Em declarações à Lusa, José Presa Ramos explica que 90% destes tumores malignos do fígado nascem ou desenvolvem-se “em fígados que estão doentes”, na esmagadora maioria com cirrose hepática.
“E a cirrose hepática surge porquê? Em Portugal a principal causa é que há um consumo exagerado, nocivo, de álcool”, lamentou, pedido um maior envolvimento de todos – “não só profissionais de saúde” – e mais políticas que dificultem o acesso e ajudem a reduzir o consumo.
Também hoje, a Organização Mundial da Saúde (OMS) Europa e a Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro (IARC) defenderam a necessidade de políticas rigorosas sobre o álcool, como impostos elevados e restrições de venda, para reduzir o consumo e prevenir o cancro.
De acordo com a OMS Europa e a IARC, as novas análises científicas reforçam a ligação entre o consumo de álcool e vários tipos de cancro, sublinhando que políticas públicas fortes são um dos investimentos mais eficazes para proteger a saúde e poupar dinheiro aos países.
José Presa aponta igualmente a necessidade de reduzir o tempo de espera de quem tem cirrose hepática até à realização de uma ecografia, que deveria ser feita de seis em seis meses.
“Estes doentes, na esmagadora maioria, estão referenciados no SNS para os hospitais públicos, que muitas vezes têm dificuldade em dar resposta atempada a esta necessidade de seis meses de rastreio”, disse o especialista, acrescentando que 40% do rastreio não é cumprida dentro desse período de tempo por falta de capacidade de resposta.
Diz ainda que há “uma percentagem importante” de casos em que é o doente que não faz o exame, “em muitos casos porque não compreende a doença, que é silenciosa”, sublinhou, lembrando a necessidade de mais literacia na população.