As províncias de Nampula e Niassa, norte de Moçambique, serão as próximas regiões a receber a campanha de tratamento de fístula obstétrica e reconstrução pélvica, problema que continua a afetar sobretudo mulheres que realizam partos em casa.
De acordo com Igor Vaz, cirurgião-geral que lidera a equipa de profissionais de saúde que está a operar pacientes no âmbito desta campanha, trata-se de uma ação desenvolvida pela Focus Fístula, uma organização moçambicana sem fins lucrativos que intervém na área da fístula obstétrica e cirurgia reconstrutiva para melhorar a saúde da mulher, restaurando a sua integridade e dignidade, através de tratamento cirúrgico especializado e gratuito.
Igor Vaz, que também participa na campanha como formador de médicos-cirurgiões baseados nesta região do país, revelou que a ideia é levar o tratamento desta campanha, que atualmente decorre na província da Beira, após Maputo, para Nampula e Niassa durante o mês de agosto, seguindo-se, dependendo da criação de condições no terreno, Cabo Delgado e Tete.
A fístula obstétrica é uma das lesões de parto mais graves nos casos de partos sem acompanhamento médico, causando danos junto ao canal de parto, que poderá do reto ou bexiga.
“O pensamento é que vamos tratar um número maior de doentes, pois a última campanha realizada em Nampula abarcou 90 dos cem doentes que acorreram ao chamamento das autoridades sanitárias”, revelou Vaz, fazendo saber que simultaneamente, a campanha está a formar médicos-cirurgiões de fístulas.
Em relação à Beira, o cirurgião fez saber que desde do início da campanha, no passado sábado, prolongando-se durante uma semana, já foram operadas sete pacientes de um universo de 30 mulheres selecionados.
“Alguns casos são considerados quase incuráveis, pois algumas destas doentes têm casos complexos cuja cirurgia poderá requerer mais tempo. Chegará ao Hospital Central da Beira [HCB] uma médica psicóloga que vai realizar um programa de avaliação do trauma psicológico e psicossocial, com vista a determinar a forma de reintegração na sociedade das mulheres com fístulas complicadas”, acrescentou.
Sobre o comportamento das parturientes, o médico sublinhou que estas mulheres têm ainda a ideia de que os partos devem ser feitos em casa: “As comunidades procuram as unidades sanitárias após a realização dos partos nalgum momento já com problema de fístulas”, revelou, anotando que a situação desta doença é preocupante.
“O país precisa de mais maternidades. Apelamos as mulheres no sentido de programar as gravidezes e não engravidar ainda em idade escolar. Os casamentos e gravidezes prematuros devem ser evitados”, sublinhou, reconhecendo tratar-se de um problema que afeta sobretudo as províncias a norte.
Desde 2018, mais de 4.000 mulheres foram operadas em Moçambique em campanhas ou em operações seletivas pelo Programa Nacional de Fístula do Ministério da Saúde, tendo a Focus Fístula garantido cirurgias gratuitas para cerca de 600 mulheres e raparigas, em particular das zonas rurais, de diferentes províncias e distritos.
A fístula obstétrica é uma abertura anormal entre o trato genital da mulher e seu trato urinário ou reto, causado por trabalho de parto arrastado e obstruído sem acesso a cuidados médicos imediatos e de qualidade. A fístula obstétrica pode ser prevenida com o acesso a cuidados obstétricos, acompanhamento pré-natal e parto seguro.
Dados das autoridades de saúde moçambicana apontam que 2.000 a 2.500 mulheres contraem fístulas obstétricas anualmente.
Zélia Cristina, cirurgiã-geral do HCB está a treinar o tratamento em fístulas ao abrigo deste programa, esperando poder no futuro reparar as fístulas de casos mais complexos.
“Já estamos a reparar as fístulas mais simples, sendo que precisamos de reparar as mais complexas e tudo indica que com o treinamento conseguiremos tratar fístulas complicadas”, disse Zélia Cristina, secundado por Mohamed Afzal Mussa, também cirurgião-geral do HCB.
“A nossa maior satisfação é ver alguém que vem ao hospital desesperado pela perda de urina e sai curado. Portanto, uma mulher com fistulas está condenada a descriminada e esta não consegue emprego e nem beneficiar de outras oportunidade”, disse ainda a médica.