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Covid-19: Médicos da Etiópia em contrarrelógio para aprender a usar ventiladores

LUSA
03-04-2020 14:53h

Raramente usados na Etiópia, os médicos correm contra o tempo para aprender a usar agilmente um ventilador antes que a pandemia da covid-19 se propague neste país, que conta 29 infeções confirmadas.

Rediet Libanos tem 28 anos de idade e durante os quatro anos que leva como médica em Adis Abeba, usou uma única vez um ventilador, há alguns meses, numa paciente com uma hemorragia cerebral.

Agora que a Etiópia se prepara para um aumento previsível, nos próximos dias ou semanas, do número de infeções pelo novo coronavírus, Rediet e seis outros médicos estão a receber formação para acelerar e aperfeiçoar a aprendizagem sobre este aparelho respiratório.

Ainda que a Etiópia registe, por agora, apenas 29 casos de infeção pelo novo coronavírus, incluindo dois doentes em estado grave, Rediet quer estar preparada para quando o país se vir confrontado como uma vaga de novos casos, para muitos dos quais o ventilador poderá fazer a diferença entre viver ou morrer.

“Estarei na primeira linha e para isso preciso de saber usar a máquina”, explicou a jovem médica, citada pela agência France-Presse.

A Etiópia, com muitos outros países de África, confronta-se com uma grande falta de ventiladores para uma população de mais de 100 milhões de habitantes.

O país tem 450 destes aparelhos, mas apenas 54 estão reservados para doentes com covid-19, segundo o diretor-geral da Saúde, Yakob Seman.

Por comparação, o estado norte-americano de Nova Iorque, um dos atuais epicentros da pandemia, diz ter necessidade de milhares de ventiladores para uma população de cerca de 20 milhões de habitantes.

As previsões do próprio Ministério da Saúde da Etiópia apontam que, no pior cenário, o país precisará de 1.500 ventiladores até final de abril.

Mas com a escassez mundial e a grande procura por estes aparelhos, Yakob Seman reconhece que não sabe como é que a Etiópia irá colmatar esta falta.

“Preocupa-me muito, porque não se trata de falta de vontade do Governo, mas de falta de recursos”, disse.

A escassez de ventiladores não é exclusiva de África e afeta também os Estados Unidos e vários países europeus, mas atinge de forma particular um continente com sistemas de saúde frágeis, altos níveis de pobreza e a lidar, simultaneamente, com várias epidemias e conflitos.

A Organização Mundial de Saúde aconselha os países africanos “a começarem a pensar em mobilizar” mais ventiladores.

“Não produzimo-los em África, por isso os países têm de começar a colaborar. Podemos começar a falar com o setor privado, com a China”, sugere Mary Stephen, responsável da OMS na República Democrática do Congo (RDCongo).

Mas os responsáveis etíopes sustentam que isto é mais fácil de dizer do que de fazer.

O Governo encomendou 1.000 ventiladores à China, mas não poderá recebê-los todos de uma vez e, neste mês, só irá receber 250, disse Yacob.

O fecho de fronteiras e a suspensão de voos bem como o aumento de preços dos ventiladores - mais de 18 mil euros, comparados com os 9 mil euros que custavam antes desta pandemia - está a criar dificuldades adicionais a todo o processo.

Com a maior necessidade destes aparelhos, as autoridades da Etiópia descobriram que 197 ventiladores do ‘stock’ nacional não funcionavam e foram enviados para reparação.

O treino dos médicos em Adis Abeba foi organizado pelo Centro Médico Norte-Americano, uma clínica privada local, que espera formar uma centena de médicos até final de abril.

A pandemia afeta já 50 dos 55 países e territórios africanos, com mais de 7.000 infeções e 280 mortes, segundo o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças da União Africana (África CDC). São Tomé e Príncipe permanece como o único país lusófono sem registo de infeção.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de um milhão de pessoas em todo o mundo, das quais morreram perto de 54 mil.

Dos casos de infeção, cerca de 200.000 são considerados curados.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

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