Cerca de 23 mil mortes poderiam ter sido evitadas em Inglaterra se o primeiro confinamento no início da pandemia da covid-19 tivesse sido implementado mais cedo, segundo as conclusões de um inquérito público divulgadas hoje.
Apesar da propagação do vírus no resto do mundo, as autoridades britânicas só o levaram a sério quando já era "tarde demais", e a imposição de um confinamento uma semana antes, em março de 2020, teria reduzido o número de mortes em 48% durante a primeira vaga, entre março e julho de 2020, indica o relatório publicado.
A ex-juíza Heather Hallett, presidente da comissão de inquérito, afirmou hoje que o Governo central e os executivos regionais da Escócia, País de Gales e da Irlanda do Norte "não avaliaram a dimensão da ameaça ou a urgência da resposta que ela exigia" no início de 2020, à medida que o vírus se espalhava mundialmente.
"No entanto, posso resumir as minhas conclusões sobre a resposta como 'muito pouco, muito tarde'", salientou.
O relatório de 800 páginas critica o atraso em decretar o confinamento obrigatório em 23 de março de 2020, mas salienta que a decisão foi correta.
"Todos os quatro governos receberam recomendações claras e convincentes para o fazer. Sem isso, o aumento da transmissão teria levado a uma perda inaceitável de vidas humanas", vincou.
Outras conclusões indicam que havia uma "cultura tóxica e caótica" no governo britânico durante a pandemia, e que o ex-primeiro-ministro Boris Johnson "reforçou uma cultura em que as vozes mais altas prevaleciam e as opiniões de outros colegas, particularmente das mulheres, eram frequentemente ignoradas, em detrimento de uma boa tomada de decisões".
A investigação acrescenta que as alegações de violação das regras por ministros e assessores também causaram "enorme angústia e enfraqueceram a confiança do público nos seus governos".
O relatório faz 19 recomendações importantes para proteger melhor o Reino Unido em qualquer pandemia futura e melhorar a tomada de decisões em caso de nova crise.
"Se o Reino Unido estivesse mais bem preparado, menos vidas teriam sido perdidas, os custos socioeconómicos teriam sido substancialmente reduzidos e algumas das decisões que os políticos tiveram de tomar teriam sido muito mais simples", salienta.
O primeiro-ministro afirma que o governo irá "avaliar cuidadosamente" todas as conclusões e recomendações do relatório e responderá oportunamente.
O grupo de campanha "Famílias enlutadas pela covid-19 em busca de justiça" aplaudiu as conclusões e atribuiu grande parte das falhas ao antigo primeiro-ministro britânico Boris Johnson.
"Embora seja gratificante ver Boris Johnson ser responsabilizado por escrito pelo desastre na gestão da pandemia, é devastador pensar nas vidas que poderiam ter sido salvas com um primeiro-ministro diferente", afirmou o grupo num comunicado.
O inquérito liderado por Hallett vai prolongar-se até 2027, devendo na próxima fase abordar o impacto nas crianças.