Os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) pagaram mais de 627 milhões de euros às equipas que realizaram cirurgias adicionais para reduzir as listas de espera, um montante que aumentou 51% entre 2022 e 2024.
Os dados foram hoje divulgados pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), que decidiu em maio avançar com auditorias às 39 unidades locais de saúde (ULS) e aos três institutos de oncologia (IPO) sobre a atividade cirúrgica em produção adicional, ou seja, realizada fora do horário normal de trabalho das equipas.
Previamente à execução destas auditorias, a IGAS efetuou um levantamento transversal para determinar se a produção adicional constitui um instrumento excecional e complementar à atividade cirúrgica programada para a diminuição das listas de espera ou se tem sido utilizada de forma sistemática e recorrente.
“No período em análise, o valor total a pagar às equipas por realização de atividade cirúrgica em produção adicional interna nas entidades hospitalares do SNS auditadas ascendeu a 627.337.595 euros, tendo-se verificado um crescimento de 51% entre 2022 e 2024”, adiantou a IGAS em comunicado.
A inspeção-geral concluiu ainda que este regime, apesar de estar definido como excecional e complementar à atividade assistencial regular, é utilizado “sistematicamente como instrumento de promoção do acesso a cuidados de saúde” pelos hospitais.
Das 42 entidades avaliadas - 39 hospitais e três IPO -, apenas as ULS da Guarda e Loures-Odivelas “não efetuaram contratualização interna com os serviços das várias especialidades”, referiu a IGAS, salientando que o processo de contratualização interna nos hospitais não segue um modelo transversal e obrigatório.
De acordo com as conclusões, em cerca de 70% dos hospitais a produção adicional assume um peso igual ou superior a 30% da produção total, o que demonstra a “utilização sistemática deste instrumento como forma de resposta às necessidades assistenciais não satisfeitas pela atividade regular das unidades de saúde”.
Nas ULS Amadora-Sintra, Trás-os-Montes e Alto Douro e de Castelo Branco a produção adicional cirúrgica representa mesmo mais de 50% da produção total, o que quer dizer que atividade realizada no âmbito deste regime é superior à atividade regular (produção base).
As dez unidades de saúde com maior valor de produção adicional representam 48% do valor total da atividade cirúrgica realizada em produção adicional entre 2022 e o primeiro trimestre de 2025.
A ortopedia e a oftalmologia são as áreas com maior peso no valor total a pagar no conjunto das 42 entidades analisadas, representando 26% e 21%, respetivamente, refere a IGAS.
“As sucessivas alterações aos diplomas legais que regulam o pagamento da produção adicional no SNS, nomeadamente da produção cirúrgica, refletem a importância atribuída à produção adicional como instrumento de promoção do acesso a cuidados de saúde”, salientou também a IGAS.
Segundo referiu, esta evolução legislativa introduziu critérios de elegibilidade mais exigentes e metas assistenciais vinculativas, “promovendo uma gestão mais rigorosa e transparente desta atividade”.
Isso permitiu, alegou a inspeção-geral, reforçar a responsabilização dos conselhos de administração dos hospitais, que passaram a ter um “papel acrescido no planeamento, na fundamentação das propostas e na monitorização dos resultados, assegurando a articulação entre os objetivos assistenciais definidos e a afetação dos recursos disponíveis”.
A IGAS adiantou que, tendo em conta o caráter exploratório da auditoria, não foram emitidas quaisquer recomendações formais, sendo os resultados destinados a promover o conhecimento e a estabelecer o cronograma de entidades a auditar em processos autónomos.
No final de outubro, O Governo aprovou a criação do novo Sistema Nacional de Acesso a Consultas e Cirurgias (SINACC) que vai substituir o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), que foi criado em 2004 para gerir as listas de espera.
Uma das possibilidades que da nova plataforma é permitir a identificação de situações anómalas, como são os casos de preços a pagar por uma cirurgia que não expectáveis e de listas de espera que estão a crescer significativamente num determinado hospital.