O cirurgião Rui Miranda Julião considerou que a Inteligência Artificial (IA) vai aproximar o doente do médico, pois ajuda a nível técnico e tecnológico, mas não consegue preencher a humanidade de que essa relação precisa.
“Acho que essa relação até vai ficar mais próxima. Porque a determinada altura as pessoas também vão exigir que não seja tudo numa relação humano-máquina. (…) Os profissionais de saúde vão ser ainda mais importantes porque também vão ter necessidade de dar mais apoio afetivo e psicológico às pessoas”, afirmou.
Em declarações à Lusa a propósito da conferência sobre IA na saúde que vai decorrer na quinta-feira, no auditório dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, integrada no XVI Congresso da Fundação Portuguesa do Pulmão, o especialista defendeu que a missão dos médicos se vai manter e terá “um aspeto mais diferenciador”.
“Na pessoa com doença autoimune, ou doença oncológica, por exemplo, além do aspeto de ordem técnica, há uma palavra humana que é obrigatória. É uma dimensão que a IA não vai conseguir”, disse.
Lembrou que IA vai permitir outro tipo de literacia ao cidadão, pois “vai dar acesso a um conjunto de dados sob o ponto de vista clínico (…) mas falta-lhe o aspeto crítico”.
“A revolução que a IA traz é que, na realidade, ela pode fazer uma tradução para uma linguagem comum da situação de doença da pessoa ou, inclusivamente, questionar alguns aspetos de tratamento do próprio médico”, explicou.
Questionado sobre se isso tornaria o trabalho do médico no futuro mais difícil, consentiu: “É um aspeto a que os médicos se têm de ir habituando”.
“Se antigamente as pessoas iam à internet, os dados, neste momento apontam que de todas as pessoas que iam à internet ver alguns aspetos da saúde, 40% transferiam-se para a inteligência artificial”, acrescentou.
Rui Julião, que pertence à direção da Fundação Portuguesa do Pulmão e é diretor clínico dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, disse que além da literacia do cidadão, a IA vai exigir literacia dos próprios médicos: “Diria que estamos aqui num momento de transição, de evolução do conhecimento, quer de um lado, quer de outro”.
Considerou o acesso, a eficiência e a qualidade como “aspetos determinantes” em saúde e diz ainda que a IA pode ajudar a facilitar o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde.
“A IA vai, na realidade, facilitar o acesso através de uma informação mais precoce e mais detalhada, desde logo [saber] onde o doente se tem de dirigir, de que forma, e se a situação é urgente ou se o utente pode esperar, marcando uma consulta para os próximos dias”, afirmou, sublinhando: “até porque não é possível ter médico de família para toda a gente. E essa questão é determinante”.
Ainda sobre o acesso, defende um reforço da municipalização da saúde, lembrando que, até sob o ponto de vista da prevenção e da promoção da saúde “nada melhor do que os municípios”.
A conferência está dividida em duas partes: “O futuro inteligente da Saúde: a visão integrada do Sistema de Saúde” e “Inteligência Artificial em Saúde: a revolução na prática médica”.