SAÚDE QUE SE VÊ

Programas para pais não evitam obesidade nas crianças pequenas - estudo

Lusa
10-09-2025 23:49h

Os programas focados nos pais são insuficientes para prevenir a obesidade nas crianças pequenas, indica uma meta-análise publicada hoje na revista científica The Lancet, que recomenda um repensar das abordagens para enfrentar o problema.

Trata-se, segundo um comunicado divulgado pela The Lancet, do “maior estudo até à data sobre o tema” publicado pela revista, que reúne os resultados de 17 estudos, com mais de 9.000 crianças com cerca de dois anos, e “não encontrou evidências de que os programas de prevenção da obesidade infantil focados nos pais tenham impacto no IMC (índice de massa corporal) das crianças pequenas”.

Os autores do artigo consideram que as suas descobertas “reforçam a necessidade de repensar as abordagens comportamentais atuais para prevenir a obesidade na primeira infância” e salientam que “são precisas ações de saúde pública mais amplas, coordenadas e com os recursos adequados”.

De acordo com um relatório das Nações Unidas de 2023, cerca de 37 milhões de crianças com menos de cinco anos sofrem de excesso de peso ou obesidade em todo o mundo e a doença tem grande impacto na saúde ao longo da vida.

A intervenção precoce, “antes que o excesso de peso ou a obesidade se desenvolvam na primeira infância”, é considerada fundamental.

A Organização Mundial da Saúde recomenda uma abordagem ao longo da vida para reduzir o risco de obesidade, começando durante a gravidez e incluindo o aconselhamento dos pais/cuidadores sobre alimentação saudável, sono e atividade física adequados para os bebés.

Sendo a doença um problema de saúde pública a nível mundial, muitos governos têm investido em programas de prevenção dirigidos aos pais, através de aulas comunitárias, de visitas domiciliárias ou da partilha de informação através de mensagens pelo telemóvel ou do correio eletrónico ou de uma aplicação, refere o comunicado.

Os cientistas quiseram “investigar a eficácia das intervenções de prevenção da obesidade infantil focadas nos pais em todo o mundo”, tendo concluído que “as abordagens existentes de programas comportamentais focados nos pais, aplicados até aos 12 meses e que visam combater a obesidade infantil, são insuficientes para melhorar o índice de massa corporal (IMC) por volta dos dois anos”.

“A obesidade é, em grande parte, impulsionada por fatores ambientais e socioeconómicos que os indivíduos não conseguem alterar. Os pais desempenham um papel vital, mas o nosso estudo sublinha que não se pode esperar que reduzam os níveis de obesidade infantil por si só”, afirma Kylie Hunter, da Universidade de Sydney, na Austrália, a autora principal do estudo, citada no comunicado.

A investigadora defende ser necessário “uma ação mais ampla e coordenada em toda a sociedade para facilitar escolhas saudáveis”, sublinhando que, além do apoio aos pais, são precisas políticas para melhorar o acesso a alimentos saudáveis, aumentar o recurso a espaços verdes e regular o ‘marketing’ de alimentos não saudáveis.

Os cientistas que realizaram o estudo fazem parte de um grupo, o Transforming Obesity Prevention in Children (TOPCHILD), que procura “determinar como funciona a prevenção precoce da obesidade” para encontrar novas abordagens, reunindo mais de 70 investigadores de 47 instituições de todo o mundo, com dados de 31 ensaios clínicos realizados em 10 países.

“Os investigadores de todos os ensaios trabalharam em conjunto e partilharam os dados individuais dos seus participantes, (…) 28.825, para analisar o impacto dos programas de prevenção da obesidade concebidos para ajudar os pais a promover padrões saudáveis de nutrição, sono e atividade nos seus filhos pequenos”.

Dos 31 estudos, 17, com um total de 9.128 participantes, avaliavam o índice de massa corporal cerca dos dois anos de idade, testando diferentes abordagens.

Anna Lene Seidler, da Universidade de Rostock, na Alemanha, e autora sénior do artigo afirma existirem “várias explicações potenciais” para o insuficiente efeito dos programas em causa.

“Uma das razões pode ser que o primeiro ano de vida de uma criança pode ser avassalador e stressante para os pais, deixando-os com uma capacidade limitada para se envolverem plenamente em mudanças comportamentais”, refere, acrescentando que poderão ser “mais eficazes (…) programas que criam ambientes mais saudáveis para os bebés” nas creches.

Indica também que “as famílias mais afetadas pela obesidade infantil – frequentemente as de grupos socioeconómicos mais baixos – são também as menos suscetíveis de serem alcançadas por programas precoces centrados nos pais”.

“As mudanças ao nível das políticas que visem a criação de ambientes mais saudáveis para todas as crianças têm maior probabilidade de chegar a estas famílias”, adianta, citada no comunicado.

Admitindo que o estudo tem limitações, como o facto de sete dos 17 ensaios clínicos terem sido classificados como de alto risco de viés devido à falta ou inconsistência de dados, os autores assinalam que quando aqueles “estudos foram excluídos da análise, os resultados mantiveram-se os mesmos”.

MAIS NOTÍCIAS