O Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) quer perceber como a obesidade é acompanhada nos cuidados de saúde primários, um projeto que vai estudar a perceção que as pessoas têm sobre a linguagem associada ao peso.
“Um dos objetivos é perceber o estigma, se ele de facto existe até também entre os profissionais de saúde quando se abordam as questões acerca do peso. Que linguagem é utilizada e se isso até, de alguma forma, demove as pessoas de continuar um acompanhamento e limita o processo da gestão da doença”, descreveu, à Lusa, a investigadora Joana Araújo.
Com o nome BRIDGE – Reduzir Iniquidades no Acesso e Gestão da Obesidade nos Cuidados de Saúde Primários em Portugal, o projeto está a ser levado a cabo desde maio pelo ISPUP, em colaboração com a Direção-Geral da Saúde (DGS) e a Unidade de Saúde Familiar Homem do Leme, da Unidade Local de Saúde de Santo António, no Porto, e conta com a participação da diretora do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável.
Decorrerá nos próximos três anos, mas os investigadores esperam apresentar os primeiros resultados já em novembro, a tempo do Congresso da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade.
O primeiro passo foi o lançamento de um inquérito ‘online’ que está a ser divulgado através das redes sociais e que é dirigido à população adulta portuguesa, com idade igual ou superior a 18 anos.
O objetivo é caracterizar a sua perceção sobre a linguagem acerca do peso, assim como determinar as preferências e respostas emocionais aos termos utilizados por profissionais de saúde quando se referem ao peso em contexto de consulta.
Hoje, em declarações à agência Lusa, Joana Araújo apelou à participação “do maior número possível” de pessoas neste questionário que está disponível no ‘site’ do BRIDGE, do ISPUP e em redes como Instagram e Linkedin.
“Não conhecemos ao certo a realidade e sobretudo a perspetiva das pessoas que recorrem aos cuidados primários. Ouvimos muitas notícias sobre os novos medicamentos para o combate à obesidade, já há muitos anos que, para casos mais severos, se fala da cirurgia bariátrica, havendo diferentes abordagens, mas falta analisar a experiência no terreno”, desenvolveu.
Com especialistas de áreas como nutrição, epidemiologia, atividade física, medicina e políticas públicas, o BRIDGE “quer mudar a forma como a obesidade é acompanhada em Portugal, tornar os cuidados de saúde mais equitativos, eficazes e centrados nas pessoas”.
Após a análise das respostas, seguir-se-ão entrevistas para perceber as experiências, quer das pessoas que vivem com obesidade, ou seja, dos utentes, quer dos profissionais.
“Como é que é feita a gestão da doença? Quais são as barreiras? Quais são as expectativas? São algumas das perguntas às quais queremos dar resposta”, acrescentou a investigadora.
Em paralelo, a equipa pretende fazer análises epidemiológicas e de saúde pública mais relacionadas com os custos de obesidade, avaliar este tema no contexto dos media, produzir materiais que cheguem ao terreno e testar novas intervenções de forma a contribuir para a redução do estigma.
“Esse estigma, em alguns casos, pode até limitar a procura das pessoas, a procura de ajuda para tratar, para gerir a doença. E também num contexto mais social até, a linguagem que se usa, nomeadamente piadas ou comentários que se fazem acerca do peso, pode ter impactos”, alertou Joana Araújo.
No que diz respeito aos media, a equipa quer perceber qual a linguagem utilizada em notícias, quais as imagens utilizadas, porque, disse a coordenadora do projeto, “isso molda as narrativas e o estigma relacionado com a obesidade”.
“Devemos utilizar uma linguagem mais centrada nas pessoas e não na doença”, insistiu.
Já no resumo enviado à Lusa, o ISPUP acrescenta que além de produzir conhecimento científico, o BRIDGE quer propor soluções práticas para o Serviço Nacional de Saúde, otimizando recursos e melhorando os fluxos de cuidados.
O instituto sublinha que este projeto assume uma missão social: reconhecer a obesidade como uma doença crónica complexa, combater preconceitos e garantir que ninguém fica para trás no acesso a cuidados de qualidade.
“Alinhado com as orientações da Organização Mundial da Saúde e com o Modelo Integrado de Cuidados para a Prevenção e Tratamento da Obesidade, o BRIDGE pretende ser uma ponte entre a investigação, a prática clínica e a sociedade”, conclui.