O Supremo Tribunal norte-americano autorizou hoje o governo de Donald Trump a cortar 783 milhões de dólares (674 milhões de euros) em investigação científica relacionada com minorias raciais ou de género.
A maioria da mais alta instância judicial norte-americana revogou a ordem de um juiz que bloqueou os multimilionários cortes feitos pelos Institutos Nacionais de Saúde nas bolsas de investigação e decididos conforme as prioridades do Presidente republicano, que se opõe a iniciativas de diversidade, equidade e inclusão e identidade transgénero (conhecidas pela sigla DEI).
Na decisão, o Supremo dividiu-se com cinco votos a favor e quatro contra, estes os quais o voto do presidente do tribunal, John Roberts, que se juntou aos três altos magistrados de tendência liberal.
A ordem essencialmente nega a tribunais inferiores o poder para bloquear decisões políticas do governo sobre atribuição de financiamento, permitindo avançar com o cancelamento de centenas de bolsas, enquanto prossegue a análise de fundo do caso.
Os autores da queixa, incluindo estados e grupos de defesa da saúde pública, argumentaram que os cortes causarão "perdas incalculáveis à saúde pública e à vida humana".
O Departamento de Justiça, por sua vez, afirmou que as decisões de financiamento não devem ser "sujeitas a questionamentos judiciais" e que os esforços para promover políticas de DEI podem "ocultar uma discriminação racial insidiosa".
O processo diz apenas respeito a parte dos cerca de 12 mil milhões de dólares em projetos de investigação dos Institutos Nacionais de Saúde que foram cortados, mas, no seu recurso de emergência, a administração Trump também evocou quase duas dezenas de outras vezes em que os juízes se opuseram a cortes de financiamento.
O procurador-geral D. John Sauer afirmou que os juízes não deveriam sequer considerar estes casos, ao abrigo de uma decisão anterior do Supremo Tribunal que abriu caminho a cortes em programas de formação de professores.
Cinco juízes conservadores concordaram e o conservador Neil Gorsuch escreveu um breve parecer, no qual criticou os juízes de instâncias inferiores por não terem cumprido ordens anteriores do Supremo Tribunal.
"Todas estas intervenções deveriam ter sido desnecessárias", escreveu Gorsuch.
Os autores da queixa, 16 procuradores-gerais estaduais democratas e grupos de defesa da saúde pública, argumentaram que as bolsas de investigação são fundamentalmente diferentes dos contratos de formação de professores e não poderiam ser encaminhadas para um tribunal de pequenas causas, onde os juízes disseram que este caso também se enquadra.
Interromper as investigações a meio do caminho, argumentaram, pode comprometer os dados já recolhidos e, em última análise, prejudicar o potencial do país para avanços científicos, interrompendo o trabalho dos cientistas a meio das suas carreiras.
A juíza liberal Ketanji Brown Jackson escreveu uma longa dissidência criticando tanto o resultado como a disponibilidade dos seus colegas para continuar a permitir que o governo utilize o processo de recurso de emergência do tribunal.
"Meio parágrafo de raciocínio (emitido sem um briefing completo ou qualquer sustentação oral) é suficiente aqui para sustentar parcialmente o cancelamento abrupto, por parte do governo, de centenas de milhões de dólares alocados para apoiar investigação biomédica que salva vidas", escreveu Jackson.
Em junho, o juiz Distrital William Young, em Massachusetts, decidiu que os cancelamentos foram arbitrários e discriminatórios.
"Nunca vi discriminação racial governamental como esta", disse numa audiência Young, nomeado pelo presidente republicano Ronald Reagan.
Um tribunal de recurso manteve a decisão de Young.
No seu segundo dia de mandato, Trump assinou uma ação judicial exigindo o fim do DEI em todas as universidades que recebem dinheiro federal.
Argumentando que as iniciativas de DEI discriminam estudantes brancos e asiático-americanos, o Departamento de Educação abriu investigações em dezenas de faculdades.
A resposta das instituições foi divergente: algumas fecharam unidades de DEI, acabaram com bolsas de estudo de diversidade e já não exigem declarações de diversidade como parte do processo de contratação, enquanto outras renomearam o trabalho de DEI ou mantiveram as suas políticas.