O bastonário da Ordem dos Médicos de Moçambique (OrMM)contestou hoje o fim do subsídio aos estudantes estagiários de medicina, justificando que o sistema tira proveito das habilidades dos “médicos especiais”, que ajudam a descongestionar os hospitais.
“O sistema está a tirar proveito das habilidades que estes médicos estagiários têm e desse proveito paga-se, em compensação, este subsídio. Portanto, eu continuo a achar que não faz muito sentido”, disse à Lusa o bastonário da Ordem dos Médicos de Moçambique, Gilberto Manhiça, sobre a decisão do Governo, de deixar de pagar o subsídio a partir do próximo ano letivo.
Estudantes de medicina das universidades públicas moçambicanas exigiram na segunda-feira a reversão da decisão do Governo, que na semana anterior revogou os subsídios atribuídos a estagiários do sexto ano do curso, apelando ao diálogo urgente e ameaçando seguirem a via judicial.
Em defesa, Gilberto Manhiça acrescentou que a retirada do subsídio vai afetar o desempenho no sistema nacional de saúde, pois os médicos estagiários “estão em um patamar completamente diferente do que usualmente faria um estudante”.
“Eles estão a aprender, mas a prática que eles exercem no seu dia-a-dia auxilia e descongestiona o sistema. Se eles não estivessem a fazer o que estão a fazer e só se limitassem a ir lá aprender, certamente que as necessidades de médicos seriam maiores do que aquilo que hoje são”, defendeu.
A prática, acrescenta, “deveria ser considerada”, porque “alivia o sistema”, e por isso tornam as necessidades dos médicos muito menores do que realmente o são.
“O tempo de espera que os doentes estão a ter seria maior do que aquilo que está a ser agora. (…) Eles fazem esse trabalho e permitem que, de facto, haja um conforto maior por parte dos médicos, dos doentes, do sistema e tornam o processo menos oneroso”, explicou, reconhecendo que o país passa “por apertos”.
Quando se trata de saúde, adianta, "não se está gastar dinheiro sem sentido e os médicos estagiários não são a razão".
O porta-voz do Conselho de Ministros, Inocêncio Impissa, disse na terça-feira que o Governo não tem “soluções mágicas” para repor os subsídios de estágio de estudantes de medicina, como exigem os estudantes, reconhecendo uma dívida acumulada superior a 100 milhões de meticais (1,3 milhões de euros).
“Não há soluções mágicas a dar, é preciso dizer-se isto. De verdade, o país precisa de produzir muito mais para ter recursos e poder investir em várias atividades. Então, não há condições de continuar a suportar esta despesa”, afirmou.
Recordou que o subsídio foi introduzido em 2004, numa altura em que existia apenas uma faculdade de Medicina no país, para atrair mais jovens para a carreira médica e só se aplicava no público, excluindo estudantes do privado e restantes setores de saúde, incluindo os que são formados no estrangeiro.
O Governo reconhece, no entanto, que muitos estagiários cumprem longas jornadas nos hospitais públicos sem qualquer compensação e por isso promete "reformular a carga de estágio", para evitar que a pressão sobre os estudantes se mantenha sem o correspondente apoio financeiro.
Ainda assim, sublinhou, o estágio no último ano do curso de medicina permanece obrigatório, “tendo ou não subsídios".
Moçambique forma anualmente mais de 200 médicos, em seis universidades, após um período de quase inexistência de profissionais no país, logo após a independência, há 50 anos, indicam dados da Ordem dos Médicos moçambicanos, avançados à Lusa em junho.
Hoje, Moçambique conta com seis instituições de ensino superior que se destacam na formação de médicos, segundo a OrMM, entre as quais estão as Universidades Eduardo Mondlane, Católica de Moçambique, Zambeze e Lúrio, e os institutos superiores de Ciências de Saúde e o de Ciências e Tecnologia Alberto Chipande.