Estudantes de medicina das universidades públicas moçambicanas exigiram hoje a reversão da decisão do Governo que revoga os subsídios atribuídos a estagiários do sexto ano do curso, apelando ao diálogo urgente e ameaçando seguirem a via judicial.
“Apelamos à abertura urgente de um diálogo com os representantes dos estudantes de medicina de forma construtiva, transparente, entre o Governo e estes, com vista à construção de soluções sustentáveis”, afirmou Isidro Felipe, representante dos estudantes de medicina de todas as universidades públicas, em declarações aos jornalistas, em Maputo, com o grupo a pedir a “reconsideração” da decisão.
O protesto surge após o Conselho de Ministros ter aprovado, a 08 de julho, a revogação do decreto que prevê o pagamento de subsídios a estudantes do sexto ano de medicina das instituições públicas, no âmbito dos seus estágios hospitalares, conforme comunicado daquele órgão.
Os estudantes dizem-se desapontados com a falta de clareza institucional sobre as responsabilidades do pagamento dos subsídios, que estão a ser passadas entre os ministérios da Saúde e da Educação. Daí que os estudantes tenham decidido recorrer para reverter a decisão.
“Nós, como estudantes, submetemos o nosso parecer ao gabinete do primeiro-ministro, assim como ao Ministério da Educação, que tutela as universidades na nova reestruturação. Igualmente fizemos para o Ministério da Saúde, que, de acordo com o decreto que foi revogado, era responsável por zelar por estes contratos por parte dos estudantes de Medicina que executaram atividades ao nível das unidades sanitárias públicas”, declarou Isidro Felipe.
Em caso de ausência de resposta das autoridades, os estudantes admitem recorrer a vias judiciais para contestar a decisão.
“Em caso de não responder, nós poderíamos recorrer a outras instâncias, poderíamos procurar de forma judicial recorrer desta decisão”, concluíram.
Moçambique forma anualmente mais de 200 médicos, em seis universidades, após um período de quase inexistência de profissionais no país, logo após a independência, há 50 anos, indicam dados da Ordem dos Médicos moçambicanos, avançados à Lusa em junho.
“Em média, entre 200 e 300 candidatos (médicos de clínica geral e dentistas) inscrevem-se para as provas de certificação em cada época”, lê-se num relatório da Ordem dos Médicos de Moçambique (OrMM).
Em 1975, ano em que se proclamou a independência de Moçambique, a maior unidade do país, o Hospital Central de Maputo (HCM), chegou a ser apelidado de “Arca de Noé” pelas “tantas nacionalidades” de médicos no espaço para apoiar o setor de saúde moçambicano.
“Aqui, no hospital, tínhamos cerca de 30 a 35 médicos e então vieram muitos médicos africanos, soviéticos, da Guiné-Conacri, da Zâmbia, vieram vários médicos apoiar. Eu costumava dizer que o hospital parecia uma 'Arca de Noé'. Tinha tantas nacionalidades que lhe chamavam a 'Arca de Noé'”, disse à Lusa, em entrevista, o cirurgião Fernando Vaz, o primeiro diretor do HCM pós-independência, que também foi vice-ministro da Saúde e, mais tarde, ministro do setor.
Hoje, passados 50 anos, Moçambique conta com seis instituições de ensino superior que se destacam na formação de médicos, segundo a OrMM, entre as quais estão as Universidades Eduardo Mondlane, Católica de Moçambique, Zambeze e Lúrio, e os institutos superiores de Ciências de Saúde e o de Ciências e Tecnologia Alberto Chipande.
“Atualmente encontram-se inscritos na OrMM cerca de 6.100 médicos, dos quais apenas 50% estão ativos”, refere, apontando as províncias de Maputo, no sul do país, e Sofala, no centro, como as que concentram a maioria dos cursos de medicina e, consequentemente, “o maior número de formandos”.