O especialista Alberto Caldas Afonso alertou hoje que a Península de Setúbal poderá precisar de medidas complementares para garantir resposta na saúde maternoinfantil e evitar que grávidas e recém-nascidos tenham de atravessar a ponte para Lisboa.
O presidente da Comissão de Saúde Materna, da Criança e do Adolescente avançou à agência Lusa que entregou, na quinta-feira, ao Ministério da Saúde o plano de referenciação da atividade maternoinfantil na área da ginecologia e obstetrícia e no início da próxima semana entrega o da pediatria.
“[A referenciação] já existe em muitas outras áreas e é fundamental que também na área maternoinfantil haja uma articulação entre os diversos hospitais, como é que ela deve ser feita, como é que deve ser organizada, no sentido de operacionalizar e de aproveitar ao máximo as capacidades instaladas”, explicou.
Do plano constam várias medidas, entre as quais um novo modelo de incentivos para os profissionais, que se juntam a outras já tomadas como a obrigação de a utente ligar para a Linha SNS antes de se deslocar a uma urgência.
“Mesmo com todas estas medidas, há zonas muito preocupantes, para as quais também poderá ser necessário termos um modelo de reorganização, para otimizar os recursos humanos existentes”, disse Caldas Afonso, apontando a Península de Setúbal como a região com “maior dificuldade na resposta na área materna infantil”.
“Não podemos ter na Península de Setúbal três Unidades Locais de Saúde com serviços de obstetrícia que na maior parte do tempo estão fechados”, disse, defendendo que o recém-nascido e a grávida têm que ter uma resposta naquela região, e “só, excecionalmente”, atravessar a ponte para Lisboa, “que já tem que dar resposta aos seus problemas e aos problemas de outras regiões”
Para isso, poderão ser necessárias medidas complementares que envolvam uma reorganização, para que a região tenha “serviços com altíssima qualidade”, com partilha de responsabilidades.
Reiterou que a região devia criar uma estrutura semelhante ao Centro Materno-Infantil do Norte, no qual é diretor, que resulta da conjugação de três hospitais.
“É uma unidade altamente diferenciada, com condições magníficas de atratividade. É isso que eu acho que Setúbal também deve ter”, defendeu.
Caldas Afonso, que preside a comissão encarregada de reorganizar as urgências de ginecologia/obstetrícia e pediatria, salientou que a situação “é complexa” nestas especialidades, principalmente nas urgências, resultante da “grande falta de recursos humanos”.
Houve “uma saída significativa” de especialistas do SNS a partir de 2020, havendo, atualmente, 760 obstetras para 39 serviços de urgência de obstetrícia. Destes, “um número muito significativo tem mais de 55 anos”, tendo o direito de não fazer urgência.
Recordou a estratégia por etapas para combater esta situação, começando por definir os recursos mínimos no serviço, que garantam a segurança para grávidas e recém-nascidos, e monitorizar em tempo real das capacidades dos blocos de parto, para melhor gestão de recursos.
A segunda etapa foi a pré-triagem via Linha SNS que conseguiu o objetivo proposto de retirar 20% dos casos ginecológicos não urgentes das urgências obstétricas, “mas não chega”.
A proposta do novo modelo de incentivos para os profissionais é a terceira etapa e resulta do reconhecimento de que as gerações mais novas têm motivações diferentes optar pelo SNS.
É uma “proposta extremamente competitiva”, com melhorias salariais, mas também com condições na formação, na diferenciação e investigação, e pretende captar os profissionais mais jovens e recuperar os que saíram, inclusive os prestadores de serviço.
“Esta medida, do meu ponto de vista, vai revolucionar o compromisso dos médicos ao SNS” e “a médio prazo vai ter os seus frutos”, disse, avançando que “há grande abertura” para iniciar um projeto-piloto em cinco ou seis unidades, que será depois alargado a todo o país.